O terceiro setor e a luta de primeira ordem contra a desigualdade social
Ações da sociedade civil organizada em múltiplos microterritórios quebram um círculo vicioso de injustiças e favorecem os mais vulneráveis
Justiça social se faz com as mãos do Estado, do mercado e do cidadão, e muito do que avançamos nessa coalizão por equidade é resultante da atuação mediadora do terceiro setor entre os sujeitos. Organizações da sociedade civil que lutam anos a fio nessa trincheira catalisam oportunidades e constroem sólidas pontes para acesso à saúde, emprego, educação e lazer.
Se em nível macro ainda falta uma política governamental de fomento substancialmente agregadora, ações do terceiro setor facilitam em múltiplos microterritórios a quebra de um círculo vicioso: meninos e meninas pobres tendo direito a incentivos para se manter nas escolas por meio de programas esportivos; mulheres vítimas de violência doméstica reconstruindo a vida ao terem a chance de abraçar uma profissão e livrarem-se da prisão do abuso; jovens que estariam fadados à miséria obtendo uma educação mais qualificada e rompendo o ciclo cruel da marginalidade que lhes é imposto.
A opinião pública parece ter entendido a urgência das demandas, ponto nevrálgico de nossa nação em desenvolvimento. Pesquisa recente da Oxfam Brasil/Datafolha (2019) destaca que a maioria dos brasileiros (86%) acredita que o progresso do país está diretamente ligado à redução da desigualdade econômica entre ricos e pobres. O mesmo estudo aponta que 94% concordam que o tributo pago deve ser usado para beneficiar as classes desfavorecidas, e avança na análise ao mostrar o racismo presente: 72% creem que a cor da pele influencia a contratação por parte das empresas.
De utópica, a atuação do terceiro setor nada tem nessa frente. Se há incautos ou capciosos que assim a estigmatizam, é por não perceberem a relevância e a eficácia de políticas que prezam por ajuda mútua, solidariedade e igualdade. Tal apoio é sistematicamente baseado no aprimoramento das leis fiscais, dados estatísticos e indicadores sociais que sinalizam à iniciativa privada o retorno positivo ao se aderir a programas que preservam princípios humanitários.
A empresa cujo DNA prioriza a responsabilidade social experimenta a valorização de um dos seus principais ativos, a marca institucional, em patamar imprecificável. Entre tantos grandes nomes, cito como referência de vanguarda a empreendedora Luiza Helena Trajano, dona de uma gigante varejista nacional que virou case de sucesso por se envolver a fundo com projetos do “setor 3” e implantar até no ambiente interno de seu negócio políticas de ações afirmativas, como processo seletivo de trainees destinado integralmente a pessoas negras.
Em aspectos financeiros, com números tangíveis, o impulso é robusto. Luiza viu os papéis do mercado mobiliário da companhia alcançarem alta de 1000% em oito anos, chegando a 2019 ao valor de mercado de R$ 37 bilhões. Isso muito se deve à forte cultura de valorização das pessoas, além, claro, da política de governança.
Apesar do esforço, empresários e representantes do terceiro setor sabem que não podem por meio de seu trabalho substituir as iniciativas governamentais nem eximir o Estado de sua responsabilidade e protagonismo nessa questão. O papel aqui é de parceria, com função primordial da sociedade civil organizada obedecendo ao lema “com todos, por todos, para todos”. Assim caminhemos. Quanto mais braços, mais abraços. Quem tem fome, inclusive de justiça social, tem pressa.
Sobre o autor
Roberto Carlos Teles Braga é Mestre em Administração Estratégica do Setor Público e Privado pela Fucape e um dos fundadores do Projeto Universidade Para Todos.
*Este texto é de responsabilidade do autor e não expressa, necessariamente, a opinião do Um Social