Mês da Mulher sob a ótica da mulher que cuida da pessoa com deficiência
A data, celebrada nesta terça-feira, dia 8 de março destaca a luta das mulheres por direitos ainda não conquistados e pela igualdade de gênero
O Dia Internacional da Mulher, celebrado nesta terça-feira, dia 8 de março, é uma data para celebrar as conquistas das mulheres, mas também serve para alertar a sociedade a respeito dos mais diversos problemas de gênero que ainda acontecem em pleno século XXI.
Ser mulher já traz um peso muito grande devido a desigualdade de gênero. As mulheres conquistaram o direito de trabalhar fora, mas o trabalho doméstico continuou sendo realizado por elas, sem nenhuma ajuda por muitas vezes. A mulher conquistou o direito ao voto, mas nem sempre sua voz e seus desejos são ouvidos. Apesar de todas as conquistas, as mulheres carregam uma sobrecarga de tarefas.
Vanderson Gaburo, presidente da Federação das Apaes do Estado do Espírito Santo (Feapaes-ES), fala sobre a necessidade de dar uma atenção especial às mulheres que cuidam de pessoas com deficiência. “Nesse mês internacional da mulher, precisamos jogar luz sobre a mulher que cuida das pessoas com deficiência. No processo de invisibilidade pela qual passam essas minorias, há também uma questão de gênero que precisa ser observada. Mães, avós, tias, irmãs… Quase sempre o principal cuidador do núcleo familiar é uma mulher que sofre com o abandono paterno, com o apagamento de sua identidade e sofre todo tipo de exclusão social”, afirma.
Um exemplo disso é Bernadete Araújo. Ela é mãe de uma pessoa com deficiência, o Ivan Carlos Nacimento, de 35 anos. Ela conta que sempre buscou atender as necessidades de seu filho, o colocando em primeiro lugar.
“No início foi muito difícil. Sempre tentei buscar ajuda e a força que eu precisava. Querendo ou não, a gente sempre abre mão de muitas coisas. O cuidado como mulher, a gente vê a realidade de outras mulheres, e a gente não tem esse tempo que muitas outras têm. A gente, com filho especial, requer um trabalho e um cuidado a mais. Você não tem muito tempo para cuidar de você mesma. Não é fácil, mas a gente sempre vai arrumando um jeitinho de lidar com a situação”, conta Bernadete. “A gente não pode negar que a gente se larga e deixa a desejar o lado mulher. Você se envolve tanto com a necessidade do filho que, às vezes, a gente acaba deixando a desejar”, completa.
A assistente social, doutora em Política Social, Célia Barbosa da Silva Pereira entende o Dia Internacional da Mulher como um dia de luta para que as mulheres possam escancarar para a sociedade a desigualdade social em que vivem todos os dias, que é o tratamento diferenciado pelo simples fato de serem mulheres.
“Todas as mulheres já são relegadas ao trabalho reprodutivo de realizar as atividades domésticas e dos cuidados com as pessoas da casa, tendo elas deficiência ou não. E isso é visto pela sociedade como algo natural da mulher. A mulher tem que fazer porque é da natureza feminina e isso não é visto como trabalho”, afirma Célia.
Ela reforça que o Dia da Mulher precisa mostrar o quanto as mulheres precisam abrir mão de seu tempo de vida para trabalhar em função daqueles que estão em sua volta, independente de serem mulheres mães e/ou mulheres mães de pessoas com deficiência, porque podem ser irmãs e tias, por exemplo, que cuidam de idosos da família.
Segundo Célia, às vezes são mulheres que não têm essa dita “natureza do cuidado” e optaram por não ter filhos, mas a sociedade relega a elas esse cuidado de cuidar de outra pessoa justamente por ser mulher. “Esse trabalho do cuidado aparece como não trabalho, como atividade amorosa, uma expressão de amor pelo outro. Não aparece o quanto de tempo de vida daquela pessoa que cuida está sendo investido nesse cuidado. E isso pode ser problemático para essa mulher cuidadora de pessoa com deficiência, porque essa mulher já tem vários enfrentamentos que ela precisa fazer na sociedade”, completa.
Célia acredita que, quando essa mulher se torna mãe, ela já tem essa sobrecarga do cuidado sendo praticamente exclusivo ou prioritário a ser feito por ela apenas por ser mulher. Além disso, essa mulher tem que enfrentar as questões profissionais: às vezes tem que mudar de profissão ou abrir mão do seu trabalho porque ela precisa de tempo para cuidar dessa pessoa, e, quando se trata de uma pessoa com deficiência, essa mulher ou essa cuidadora fica sem rede de apoio, inclusive familiar e de amigos.
“Muitas vezes essa mulher acaba tendo que abrir mão de muito do seu tempo de vida para possibilitar a vida de qualidade para a pessoa que ela cuida. E aí, seja pela ausência dessa rede de cuidado compartilhado, seja pela ausência de políticas públicas para o compartilhamento desse cuidado, essa mulher vai abrindo mão de várias questões da sua vida. Ela abre mão do emprego, depois ela abre mão da atividade física, porque ela não tem com quem deixar essa pessoa de quem ela cuida, abre mão da sua saúde, porque não consegue ir a médicos e fazer exames com regularidade. Isso acontece porque nenhuma política é pensada na especificidade dessa mulher”, destaca a assistente social.
“É uma vida que a sociedade camufla como sendo de uma mulher guerreira. Na verdade, as mulheres que cuidam de pessoas com deficiência não são guerreiras. São mulheres cansadas, mulheres que tiveram que abrir mão de muito tempo da sua vida para que seus filhos tivessem os seus direitos garantidos”, conclui.
E é por isso que o mês da mulher é tão importante: para dar visibilidade às dificuldades da mulher, principalmente daquelas que cuidam das pessoas com deficiência, perante a sociedade e ajudar a mudar essa realidade.